Pequenos Burgueses, Gorki
São vários os personagens que compõe o enredo. Não tenho condições nem informações para descrevê-los singularmente. O que eu mais gostei foi Teteriev, um afilhado do chefe da casa, que se mete a filosofar vez ou outra: “Quando dizeis que o mal se paga com o bem, vós vos enganais. O mal é uma qualidade que vos é inata. E por isso de pouco valor. O bem, vós inventastes e pagastes terrivelmente caro. E em virtude disso o bem é uma coisa valiosíssima, rara. Conclusão: colocar num mesmo plano o bem e o mal é inconveniente e inútil. E eu, em verdade, em verdade vos digo: pagai o bem com o bem somente! E nunca além do recebido, que é para não estimular no homem a tendência à usura. Porque o homem é ávido! Tendo recebido uma vez além do que lhe é devido, da próxima vai querer receber ainda mais. Mas não lhe pagueis menos do que lhe é devido. Porque, se o enganais uma vez, o homem é rancoroso; ele dirá de vós: são uns falidos! E deixará de respeitar-vos. E da próxima vez não será mais o ‘bem’ que ele vos fará. Ele se contentará, simplesmente, em vos dar uma esmola. Irmãos! Não há nada mais triste sobre a terra, nem mais repugnante, do que um homem dando uma esmola ao seu próximo. Pagai o bem estritamente com o bem. Quanto ao mal, pagai cem vezes mais. Sede pródigos aos retribuir ao próximo pelo mal que ele vos ocasionou. Se quando pedirdes um pão vos derem uma pedra, descarregai sobre sua cabeça uma montanha!” (p. 59). Convenhamos passagem digna de Maquiavel!
Outras passagens mostram algumas angústias desta condição miserável: “Quando eu digo ‘sim’ ou ‘não’, eu não digo por convicção... eu respondo, simplesmente: ‘sim’ e ‘não’... Às vezes uma pessoa diz ‘sim’, e logo em seguida pensa: será? Talvez seja ‘não’...” (p. 166).Ou ainda: “... talvez você tenha simplesmente medo, medo de crer... A fé cria obrigações...” (p. 166).
Existem também personagens que tentam consagrar seu heroísmo de alguma forma: “Eu vou obrigar a vida a me responder como eu quero. Não adianta tentar me fazer ter medo. Eu estou mais perto da vida que você! E sei, muito mais que você, que a vida é dura, que às vezes é repugnante, má. E que uma força desenfreada oprime o homem. Eu sei, e isso me deixa indignado. Mas essa ordem eu não aceito! Eu sei que a vida é uma coisa séria, mas ainda não está bem organizada. Para ajudar a organizá-la eu vou ter que dar toda a minha força, toda a minha juventude. Também sei que não sou nenhum herói, mas simplesmente um homem! E digo mesmo: não me importa, nós é que vamos vencer! E com todas as minhas forças, eu vou me colocar na própria espessura da vida. tratar de moldá-la, atrapalhando uns e ajudando outros.... Isso é a alegria de viver!” (p. 185).Mas no fundo todos seguem o mesmo principio que é: “inteligente dentro de medidas, estúpido dentro de medidas, bom dentro de medidas, mau dentro de medidas, honesto e canalha dentro de medidas, covarde e corajoso... você é um pequeno-burguês exemplar. Você encarna muito bem a mesquinharia consumada, esta força que derrota até os heróis... e que vive e triunfa” (p. 95).